28 setembro 2010

SANGUE NO ÔNIBUS

Sentada na poltrona do lado da janela, queria quebra-la! O ar condicionado apontado pra minha cabeça e o ar me faltava. Como pode faltar o ar? Há muito ar, poluído, mas há! Um caminhão grande na pista do lado, aquele trombolhão parecia que esmagaria o ônibus, meu corpo começou a ter tremilique.
A Voz disse para mim: respire, encha seu corpo de ar e solte devagar, está tudo bem - a Voz é meu lado sábio que fica só me olhando e me ajudando nesses momentos. Obedeci e muitos minutos depois de muita respiração completa saltei no meu ponto, vi que o outro ônibus que deveria pegar já estava lá, mas ao invés de entrar nele sentei na mureta, minha vontade era deitar de tanto cansaço. Respirei fundo o ar poluído, olhei para o céu cinza e fiquei ali esperando o próximo busão.
Entrei, um senhor tentou puxar papo e eu fui educada, mas evitei falar muito, pois vi que qualquer esforço o sangue escorreria assento abaixo. Ele insistiu e eu fiz força para conter a hemorragia dizendo: "tô voltando do psiquiatra que não me deu alta para sair do hospital, ele diz que eu tenho uma doença mental, vê se pode!" E pisquei os olhos com força algumas vezes e chacoalhei a cabeça, tive que segurar o choro. Se ele insistisse em manter conversa seria capaz de ver minhas lágrimas vermelhas escorrendo, estava prestes a ter um vazamento sanguíneo de cada poro do meu corpitcho, mas ele acenou com a cabeça e se calou.
Essa crise foi resultado da terapia corporal. Além da mente temos o corpo o qual tem uma memória incrível. E na terapia corporal chegamos em uma memória que há muito sabia estava prestes a ser lembrada. Senti meu corpo todo em carne viva e o que mais queria depois do atendimento era chegar em casa e deitar e chorar até secar,  na espera do sedativo fazer efeito para a ardência diminuir.
Todos na face da Terra tem traumas, é natural. Mas traumas que vem de abusos intensos ocasionam danos que para serem reparados requerem muito tratamento e esforço por parte do paciente, meu caso! Vivi anos inserida em um ambiente insalubre, violento, repleto de abusos psicológicos e anulação de mim, que a tendencia a depressão encontrou o local ideal para se desenvolver e se transformar em um monstro que foi capaz de me levar a tentar suicidio duas vezes.
Quem não chegou nesse limite na minha família talvez ainda viva com uma fantasia de um lar que nunca existiu, mas quem tem que fuçar em tudo, revirar o lixo para poder fazer a faxina e continuar o caminho livre dos entulhos, como eu, sabe bem de qual realidade veio.
Fiquei de escrever aqui os processos das terapias, mas são tantas coisas ainda... Como diz a terapeuta sou um Forum muito cheio de processos, são tantas atividades que ainda não consegui parar e organizar a escrita dessa minha vida interna em busca da cura da depressão.
Mas sinto que ela está bem próxima, finalmente depois de 20 anos, sinto que estou encontrando na mente e no corpo as raízes da doença e sem dó vou arrancando esta praga!
Até que ela seja arrancada por inteiro vou no supermercado comprar um chocolatinho...

5 comentários:

Bruno David disse...

QUERIDA ALYSON!!
SAUDADES DE VC!

FICO FELIZ DE VER (E SENTIR) VC SEMPRE EVOLUINDO. ENFRENTANDO. OLHANDO PRA VC COM CARINHO!

Lembra que comentamos de realizar um bate papo virtual. Nós podemos fazer pelo SKYPE!!!. Interessa?

GRANDE ABRAÇO!

Carina disse...

Eu acho q todo consultório terapêutico devia ter uma salinha ao lado à prova de som e com as paredes almofadadas para dias de terapia como esse q vc passou. Ao invés de ir direto para casa, iria para a salinha e colocaria tudo pra fora: gritaria, socaria as paredes, se jogaria contra elas. Eu faria tudo isso, pois tenho vontade sempre que entro em crise.
Como vc escreveu no Facebook que riu... É engraçado, mas é real. É duro "levar um murro desses" e ter q sair na rua, encarar a sociedade, o senhor puxando conversa no ponto. Eu acho q não seria educada como vc. Não conseguiria. Aliás, cada dia que passa, tenho menos paciência com os normalóides e suas vidas tão iguais, e suas perguntas de sempre.
Mas, como disse o Calvin, é bom te ver evoluindo. E como já escrevi aqui, dói, mas a gente percebe o quanto vc cresce. Eu sempre digo: quando crescer quero ser igual a vc!! :)
Beijocas e se cuida!! Qualquer coisa, é só gritar!

Beijocas, Calvin!! ;)

Ana Maria Saad disse...

calvin, menino como ta tu??? tenho pensado em vc! vc voltou?
qto ao bate papo quero ver isso sim, mas to com tanto trabalho..
ca, vi sua msg e depois respondo! adorei a sugestão da salinha!!! hahahaha e é mesmo duro ter q sair assim pra society. é como alguem que acaba de er o braço arrancado ir pegar um onibus... mas realmente os normaloides nao tem como entender isso...
e vc nao quer ser assim não pq vc é da turma dos 4 patas! um povo mto bom!
tava com sodade de vcs!
bjoka

Bruno David disse...

Olá Alyson! Querida!
Então... Estou na VIDA! Sinto que estou me APROFUNDANDO muito em mim! Isso é bom... Tenho minhas crises... mas estou de pé, e estou tentando pensar no lado BOM da minha vida. Ela até que é BEM interessante!
Então... ESTOU VOLTANDO... Aos poucos...
Precisava escrever mais pra mim... Precisava ver se o que queria era atenção apenas, precisava de apoio, ou se precisava mais era CUIDAR DE MIM.
Você tá trabalhando bastante? Me dá umas dicas... eu até agora só trabalho em mim mesmo... Como tem conseguido, obrigações apenas? VONTADE?
SAUDADES TAMBÉM!

GRANDE ABRAÇO MEU!

Ana Maria Saad disse...

calvin,
esse é o processo né! uma vez começando a aprofundar não tem volta! é como nascer! depois que começa o trabalho de parto, mesmo que exista o receio do novo e ja a saudade do utero quentinho, não tem como voltar atrás! e sim, é preciso tempo para se adaptar a nova fase, tanto que os bebes dormem mto!
eu trabalho bastante, mas veja so meu trabalho esta completamente ligado ao trabalho em mim, essa é minha historia. é tdo uma coisa só. mas ha umas semanas atras em que o tratamento atingiu a ferida, eu sangrei mto, nao me recolhi e o q me aconteceu foi q fiquei mto doente, febrão! o que me obrigou a parar e descansar, como os bebes fazem.
fui me conhecendo e descobrindo como lidar comigo e a doença e esse processo de cura, e acredito que isso seja trabalho pr toda vida!
c cuide!
bjoka