08 novembro 2011

Melhora em uma sociedade doente...

Passei minha vida tendo que lidar com uma mente sequelada e doente. Passei a vida ouvindo que isso era "psiquite e frescura". Sim era muita frescura da Depressão que não querendo ficar sozinha convidou seus amigos para fazerem festinha na minha cabeça! As tais comorbidades, que são outros transtornos mentais que podem acompanhar o primeiro!

Por exemplo: além da Depressão tive: 
- ainda criança, um transtorno em que a pessoa arranca os próprios cabelos, até a empregada*  (*secretária do lar, para quem gosta de eufemismos) comentou as falhas na minha cabeça e eu ainda achei ruim com ela!; 
- fobia escolar - de 11 anos em diante, as vezes passava semanas sem ir para a escola, e quando minha mãe pegava no meu pé eu fingia que ia, mas não ia. Acordava cedo, me trocava e me escondia em casa mesmo, depois que minha mãe saía eu ficava vendo TV e pedia para a empregada* não contar nada para ela. Fora que na fase da adolescência mudava de escola com frequência e ficava sozinha nos intervalos, não por causa de bullying, mas porque eu não suportava a convivência;
- já depois na faculdade tive também pânico; 
- na infância até fase adulta tive claustrofobia; fobia social; transtorno de ansiedade; compulsão, principalmente a alimentar, abuso de substâncias - no meu caso alcool - fobia de sangue que me salvou da segunda tentativa de suicídio, assim como a falta de energia que me salvou de tentar o enforcamento!
E fora outras comorbidades que devo ter tido mas nem cheguei a reconhecê-las, porque não tive tratamento durante a infância e adolescência! 
Quando finalmente fui diagnosticada com Depressão infelizmente não conheci tratamentos psicoterápicos mais modernos, a não ser a malice da psicanálise (sinto muito eu detestei!), e os remédios mal administrados ao invés de ajudarem me atrapalharam mais ainda! 
O que me deixou pior, pois se os especialistas e os adultos cheios de títulos e conhecimento não estavam me ajudando acreditava que ninguém mais poderia, ou que realmente o que tinha era frescura! A culpa se acentuou como nunca! E vivi assim com uma mente transtornada, doente, péssima durante a maior parte da minha vida! 
Hoje tenho 30 anos e ainda colho os frutos podres de uma Depressão acompanhada de outros transtornos que me acometeram na infância, e que demoraram para ser tratados como deveriam: com afinco, compreensão e apoio! Apoio!
Gente o pior do mal estar, o pior de ter um transtorno mental, são os julgamentos e análises das pessoas a nossa volta, como o famosos:
-"ai de perto ninguem é normal mesmo!" - um normaloide não tem idéia do que é ter uma mente doente de verdade! Não apenas uma leve depressão! E é por causa desse tipo de ignorância, entre outros, e falta de interesse dos normalóides que quando alguem realmente está doente da cabeça fica tão sem graça de se tratar e tomar remédio e pensa que "ai preciso ser forte, não posso expor minhas fraquezas, ninguem é normal mesmo!" - quando na verdade a pessoa está doente! Precisando de cuidados! É como aquele lance de quando alguém tem câncer: "ai o que será que a pessoa fez..." Gente a pessoa é pessoa, ser humano que está sujeito a adoecer, se até cachorros tem câncer, ela não fez nada, simplesmente nasceu...
- "ai é influência de espíritos"! Antes do povo ficar falando que tudo é "espilto" deveriam ir estudar psicologia e um pouco de psiquiatria para entender como é o funcionamento do cérebro, mas principalmente da mente! E como a danada é complexa! Acredito que antigamente (até hoje) havia os manicômios que tratavam os doentes como lixo e então o espiritismo ajudou muito num tratamento mais humano e aí instalou-se esse mito de que os problemas mentais são na maioria dos casos obsessões e influência de "espiltos" e não casos psiquiátricos! 
Gente, a cabeça da pessoa está doente, então primeiro o que vem primeiro: investigue o corpo, faça exames, está tudo bem, então vá para a mente! Histórico de vida ( a gente tende a falar que tivemos uma infância e adolescência maravilhosas porque é mais bem visto pela sociedade, ainda mais com a encalacração das religiões onde a gente não pode "falar mal" dos pais!"), investigando a si a fundo é que se melhora! 
Fiz tudo isso e hoje me deparo com um paradoxo: eu melhorei, achei as causas da depressão, tenho ferramentas para me manter conectada comigo mesma, mas estou inserida em uma sociedade inconsciente do que é ser ser humano, onde o modo de vida normalóide impera - vive-se roboticamente em favor do senhor que é o dinheiro. E assim como todos tenho contas a pagar e sou escrava do sistema financeiro, esse algoz cruel que fode a vida da maioria dos indivíduos sem dó nem piedade. Como me manter equilibrada nesse contexto?
Esse post de hoje é um desabafo, porque por mais que me sinta melhor da depressão (tem 5 meses que não tive mais sintomas), minha vida ainda se encontra de pernas para o ar por estar inserida na society - não tenho renda, tenho que batalhar que nem louca pra ver se consigo fazer essa Ong que fundei - Instituto Pensamentos Filmados - engrenar, mas pelo andar da carruagem só daqui 200 anos a sociedade normalóide entenderá a relevância do trabalho, tomara que esteja errada! 
Aliás, so fundei essa Ong porque só uma pessoa com o grau de birutice em que me encontrava poderia fazê-lo! Pois foi graças a esse trabalho de exposição da minha história (para desagrado de uma das minhas irmãs) a fim de causar reflexão e troca, que comecei a melhorar! 
Mas pelo jeito minha melhora aconteceu e talvez seja hora de encontrar outro modo de vida, porque a sociedade realmente está me espirrando e para quem já sofreu demais com uma doença horrenda, a minha saúde mental sempre será prioridade! Fora isso não tenho nada a perder!
A seguir cenas...





10 comentários:

carla guedes disse...

Jamais pensei ler estas palavras com as quais me relaciono e me identifico...
Passei a minha vida a lidar com um cérebro no mínimo diferente do comum dos mortais, sempre a tentar sequestrar-se a si próprio.
Ana, agradeço a Deus ter escrito este blog para eu poder pensar que não sou a unica "sobrevivente"...
A companheira solidão sempre canta perto dos nossos ouvidos mesmo no meio das multidões e por isso é tão importante nos unirmos nestas experiências.
Carla Guedes

Anônimo disse...

Mais uma vez leio o que vc escreve e sinto que sua história é minha história, assim como a de muitos outros... Só que tomados pela vergonha nunca falamos e não conseguimos encontrar com quem trocar experiências. Sinto a mesma coisa que você, essa depressão tudo que ela traz junto deixaram a minha vida de pernas pro ar e isso acaba sendo mais um motivo para me sentir mal... Hoje foi esse dia... blehhhh

bjs

Spock disse...

Se o apoio de um desconhecido tiver algum mérito, quero lhe dizer que é um alívio e ao mesmo tempo confortador encontrar alguém com coragem e lucidez bastantes para confirmar que nossos piores momentos, longe de ser exclusivos, são parte de uma realidade comum de quem se propõe a enfrentar o tormento da depressão (e suas cormobidades!). A society é doente mesmo e não vai mudar, permanecerá centrada no culto ao sucesso financeiro-profissional - a qualquer preço. Forçoso apreender a lidar com essa realidade, o que torna nossa situação ainda mais complexa.... Ana, além de autora generosa, você é atriz cujo talento comparo ao de Mélanie Laurent. Não preciso dizer mais nada, né! Então, segura a onda, mulher-força-da-natureza! Saúde mental em primeiríssimo plano, essa é nossa sina.
Afetuosamente,
Spock - another survivor

Ana Maria Saad disse...

oi carla!
bela é isso mesmo:
vamos nos unir e falar! falar para a sociedade normaloide dessa outra realidade da vida ainda tao ignorada!
vamos falar!!!!
bem vinda!!! e obrigada!!!!
bjoka

Ana Maria Saad disse...

oi rick!
mas so da gente ir encontrando os semelhantes ja alivia um bocado!
pelo menos eu tenho um alivio imenso de saber q vc ta por ai!
hihihihi!

vamos q vamos! falando e falando!
a gente ta no processo da transformação!
vixe!
bjoka

Ana Maria Saad disse...

spock
tb nao preciso dizer nada ne!
so q vc m fez rir!
ai como é bom rir!
e acho mesmo q quem vai a fundo na depressão desperta pra uma outra VIDA!
e essa rede de apoio e carinho q formamos ajuda demais!
obrigada! obrigada!
bjoka

Sérgio Paffer disse...

Olha Ana está pra fazer 1 ano que eu conheci o teu blog e o teu trabalho.Antes disso eu vivia,como vc diz "no armário",com vergonha e com medo de que as pessoas descobrissem que eu sofresse de depressão.
Depois que eu comecei a visitar o blog,assisti aos filmes,principalmente o V.I.D.A. alcancei um entendimento maior de mim mesmo e comecei a encarar a doença,que no meu caso é a depressão por um outro prisma.
Foi VOCÊ,através do seu blog que abriu um novo mundo de possibilidades para mim.Foi O SEU EXEMPLO de Coragem,determinação e generosidade que me inspiraram a me expressar e ver a mim,a doença e essa sociedade por um outro prisma.E combater assim,o pior dos preconceitos,o preconceito comigo mesmo.
Foram anos e pela minha própria história de vida,de desqualificação,onde sempre fui colocado como um ser menor por ter adoecido que formaram o que sou hoje.Portanto sei que mudar não é fácil,mas também não é impossível.
Foi graças a VOCÊ,que hoje em dia fiz um blog onde falo do meu trabalho e da depressão,procurando da forma que me é possível,posto que o assunto é demasiado "chato,pesado,atrai coisa ruim",etc, que procuro instigar as pessoas a olharem para as doenças mentais e para as doenças em geral por um novo prisma.Que podemos ter um lado doente e mesmo assim,temos a escolha,a opção de nos fortalecer e apesar dele,investir no nosso lado saudável,que também permanece.
Na maior parte das vezes o retorno que tenho é muito pouco,as pessoas simplesmente não se interessam,pois o ser humano em geral só procura saber de algo,quando ele passa por isto.Mas mesmo assim continuo fazendo a minha parte.
E depois que assumi que tenho depressão,isso causou uma revolução na minha vida.Pessoas se afastaram e outras nem sequer chegam perto,acho que com medo de "pegar",rsr,não sei.Por outro lado outras pessoas se aproximaram e se identificaram.
Não devemos ter vergonha de nada,pelo simples fato de não termos escolhido adoecer.Ninguém discrimina um diabético,um hipertenso,então porque vamos nos permitir ser discriminados?Ah,porque a sociedade não entende?Problema da sociedade,e que problema,pois a epidemia de depressão já começou e aí,como vai ser?
Não devo ser um bom escritor,meu blog não tem recursos bacanas,nem eu entendo de informática,mas eu coloco lá meu sentimento e demonstro com os posts que,apesar de conviver com a doença não é ela que me define,o que me define é aquilo que eu puser meu foco.
Estou sempre bem?Não.Mas a cada dia me levanto mais rápido,pois conheço algumas ferramentas e as uso,assim como me conheço mais um pouco a cada dia.Entendo tudo o que vc expôs e a sua dor é a minha,como a de todos os amigos e me irmano a vocês nessa busca de resgatar nossas vidas.
Não importa o tempo que leve,não importa a ferramenta terapêutica que se utilize,cada um tem buscar o que lhe serve,mas um blog como o seu é uma fonte de abastecimento e um lenitivo para muitos e eu agradeço a Deus por vc existir.
Não tenho dinheiro pra te ajudar,mas saiba que tem em mim para todo o sempre um amigo e um irmão com quem vc sempre contará.E somos parceiros nesta estrada de disseminar informação,tolerância e solidariedade.Mãos que se unem fazem a vida mais leve.Abraços de luz.
Sérgio Paffer.

SurvivorWoman.30 disse...

Tão impressionante quanto as semelhanças da tua idade e do tempo em que as mesmas dificuldades te pertubam, foi ler as palavras de outros que também se identificam tanto. Sou uma sobrevivente muito recente, ainda sem esperanças e com a sensação de que, inevitavelmente, não é possível se libertar disso antes de consumar esta estúpida e incontrolável vontade.

Ana Maria Saad disse...

serginho,
obrigada querido!
tb sou grata por vc existir e estarmos juntos nessa caminhada!
seu blog ajuda!
e como tdo na Terra: daqui 200 anos o povo entendera o q dizemos!
paciencia, né!
ate la é buscar os recursos (dindim) pra poder viver aq...
vamos fundar um bco ou assaltar um? pq realmente nao ha diferença de uma coisa pra outra, né! hihihihi

bjoka

Ana Maria Saad disse...

survivor woman
espero q vc melhore!
tem jeito sim, tem tantas ferramentas a disposição... é difcil mesmo, mas com dedicação a si mesma, se abrindo para um novo modo de vida, a gente melhora sim!
c cuide!
bjoka
e de uma olhada no site da ong:
www.pensamentosfilmados.com.br